segunda-feira, novembro 26, 2012

"Te inventei porque você não existia"

É natural que não tenha sido na nossa cidade. Tenho me sentido cada vez mais cidadã do mundo enquanto me esparramo pelos estados do nosso país. Deixo em cada canto um pedaço. O sorriso da minha família na Bahia. O encanto dos meus amigos no Rio. O aconchego da proximidade e o mais perto de ser raiz em São Paulo. Em cada estado deixo um estado de mim.

 Foi no Rio que deixei a graça de ter você. Foi lá que acabou a espera e recomeçou o encanto. No campo do desencontro e da impossibilidade nós demos aula. Na universidade das impossibilidades somos mestres. No universo da poesia nos construímos em rimas pobres. Em prosa fizemos contos e nos encontros desfazemos possibilidades. Foi naquela viagem com o grupo de amigos marcados pelo tempo e por desentendimentos. Nunca fui de fácil tato. Abstraio, mudo, me refaço longe e quase nunca volto. O destino era o Rio e os outros também eram nós.

 Neguei o café no restaurante da Lapa porque queria chegar cedo em Santa Teresa, você resolveu me acompanhar e nós subimos a pé. Foi quando me abraçou demonstrando ter o meu mapa em suas mãos, os seus dedos ao redor de mim, brincando com o segredo que guardo nas costas. Te perguntei o que você queria e você me soltou. Me acusou de quebrar o encanto. Destacou erros seus que não existem, nunca existiram, não te cabem. O papel de mártir você nunca desempenhou bem. A fraqueza encobre o seu talento em ser. E nada disso me parece seu. Te fiz olhar nos meus olhos e me dizer o que era aquilo. Você se virou apressando o passo.

 Fiquei olhando você ir, de novo. Pensando como nunca fiz efetivamente nada, a não ser estar paciente, te escrevendo em mil textos que sempre foram só meus. Foi quando te parei mais uma vez e te dei um beijo. Daqueles que se perdem no tempo do que ficou para trás e apagam inúmeras certezas. Daqueles que cabem carinho e desejo.

 Nós afastamos sem dizer nada enquanto continuávamos subir até Santa Teresa. Notava seu nervosismo e poderia prever que suas pernas tremeriam mais do que o comum. Lembro do seu infinito tique com o qual adoro implicar. Nas aulas da faculdade evitava sentar na sua frente, me irritava o seu all star pendurado na minha cadeira enquanto suas pernas incansáveis e insanas, se mexiam.

 Você falou algo sobre certo e errado. Falamos sobre acertos e erros. Te falei mais uma vez sobre o meu tempo estar no agora. Não acredito em uma felicidade plena e eterna. Acredito em momentos felizes plenos e duradouros, me garanto o direito de criar e viver vários, coloco eles na minha história. Chegamos a Santa Teresa... pensamos em descer para conversar com eles e contar sobre nós... Mas, daí, o meu celular tocou e eu acordei...

 Foi isso (também) um sonho.