domingo, julho 22, 2007

CALÇADA

Ando até as pernas deixarem de responder aos meus comandos. Procuro em algum lugar a paz que me aquiete. Cansada de falar tanto e quase sempre. Ou de simplesmente engolir minhas palavras e silenciar. Minha vida é uma montanha russa sem cinto de segurança. Os trancos me impulsionando para frente e o movimento acelerado me prega as costas na cadeira. Essa rapidez da vida às vezes me tira minha pouca calma. Cansada de pisar sempre nos mesmos cacos do caminho, ensaio um milhão de vezes tritura-los. Fazer do meu passado pó. Depois assoprar para que ele se misture com o ar e vague tanto quanto tudo foi vago. Vestida de mulher para esconder a menina que brinca aqui dentro, caminho pelas ruas dessa cidade. Procuro o lugar onde tudo faz sentido. Alguém para entender minhas palavras. Sem julgar entre alto ou baixo. Pequeno ou grande. Minha vida sem certidão reconhecida em cartório. Fortemente influenciada por algumas coisas e indiferente a outras. Indecisa entre sonho ou ilusão. Pregada ao meu mundo enquanto há tanta vida lá fora. Esqueço as chaves de casa. Aproveito a calçada para relembrar o passado. Aperto minhas pernas enquanto todo mundo que um dia viveu começa a descer a rua.
Lágrimas rolam em um ritmo frio. Tudo que vivi e hoje mantenho longe. As saudades enrolada com a ilusão. Talvez, tudo não tenha passado de um sonho bom. Exatamente o que quero carregar. Sinto saudades. Uma falta enorme de quando acreditei que tudo poderia ser para sempre. Acordar de manhã e encontrar meu porto seguro. Porre. Brigas. Lágrimas molhando os bancos. O eco todo que encontravam nossas risadas dentro dos blocos. E tudo coexistindo. Nossas diferenças brincavam de amarelinha enquanto nossa igualdade produzia elos. Sinto falta. Do pôr-do-sol e do nascer dele. De acordar no escuro e demorar para amanhecer no horário de verão. Tudo que deixamos de aprender com alguém mais velho para puxar de um filme qualquer no cinema.
Acreditei que tudo podia ser para sempre. E que eu seria diferente. Meus mortos enterrados, não como eles estão agora, ainda há vida naquilo que queria enterrar. E muita morte no meu presente. Sinto cada pedaço do meu corpo tremer enquanto minha cabeça se enche do nosso sentido. Uma família grande. Com todas as brigas e até certa falsidade. Alguns blocos e a certeza de que nossa juventude seria eterna.
E agora todos tem obrigações. Alguns as mesmas e pouca coisa mudou. Outros encarando a vida de frente sem poder sentar para chorar quando a vontade é forte. Engolir em seco cada sentimento ruim.
Queria de volta o meu desespero juvenil e as minhas incertezas. Quero queimar como sempre foi. Vontade de gritar mas só há silêncio ao meu lado. Gostaria de rir mas só há indiferença. Queria cantar mas não lembro a letra. Só uma vaga melodia embala minhas saudades.
Alguém conhecido vem descendo a rua. Chegou alguém com as chaves. Escondo minhas lágrimas, odeio enfrentar perguntas óbvias, chorei e choro quando apagam as luzes. Quando a montanha russa tá lá embaixo. Me embebedo de saudades e me nego a matá-las. Por enquanto prefiro a certeza de que tudo não foi uma doce ilusão. No meu quarto sinto minha alma sugada e o sono me desespera. Encontro minha cama enquanto apalpo o escuro. E durmo. Durmo. Durmo.
Amanhã tudo será diferente, ou não.