QUEM ME CALA?
Eu não sou de ninguém. Não sou porque esquecerem de colocar um manual de instruções quando me fizeram. Não existe manual e ninguém é capaz de me entender. Ninguém. Nem quem acha que entende tudo o que eu falo. Ou entende de verdade quem eu sou. Eu não sou nada além de um emaranhado de palavras querendo fazer sentido. Não sou nada além de uma menina que se guia por um teclado. Não sou. Não adianta tentarem me fazer melhor do que e possível me convencer de que sou. Não tem cabelo bom, roupa boa, gostos bons. Nada dá jeito. Porque eu desacredito. Não sei ser de ninguém. Não sei. Não quero ser. Não vou ser. Ouviu? Ouviu? Não tente me parar. Ou tente. Mas, se for tentar, consiga. Cale minha boca e a minha cabeça. Segure meus dedos e meu cérebro me deixe tão perto de você que não conseguirei mais respirar sozinha. Me prenda. Segure minhas mãos. Meus dedos. Meu olhar. Não me censure, jamais, odeio que o façam. Eu sou minha, minha com certidão assinada em cartório e firma reconhecida. Nada me para. E eu sei, sei mesmo, que se eu quiser de verdade uma coisa, lá dentro, bem fundo. E se não for só para mim. Eu consigo. Porque eu preciso de outros. Não consigo pensar só em mim. Nem sei se eu existo ou se sou fruto da minha imaginação. Não sei. Imaginação, como a tenho. Tanta. Fértil e recheada de clichês. Porque a vida é um grande clichê redondo. Bolo de merda. As merdas todas dos certinhos, dos errados, dos bonitos e dos feios. Merda. Um monte dela. Minhas merdas e meu teclado conversando num compasso desigual. Não, eu não sei ser só. Não sei. Não sei. Não sei mais o que me prende. Nada. Ninguém me tira as palavras. Preciso de alguém que as leve daqui tão longe. Alguém que me dê paz. Você. Simplesmente você.