domingo, junho 17, 2007

COCA AGUADA

O último gole da coca aguada. Os sentimentos todos ali saindo pela porta da frente com uma música de fundo e os créditos subindo. Cada um daqueles personagens é um pouco de mim e no final eu não sei quem escolho para ser o principal. Estava testando minha vida. Quando decidir começar a encenar este teatro de arena, que é viver, quero ter certeza de quem serei. Enquanto isto, ou para sempre, sinto que não foi à toa que larguei o teatro duas vezes. Nasci para pregar letras na vida ou a vida se prega inteira nas minhas letras. Não sei. Não penso e os meus dedos simplesmente vagam pelo meu teclado já apagado. E eu desisto de encenar qualquer coisa. Ou vou no improviso. Minha peça é toda no improviso. Esqueço os detalhes e às vezes volto no meu ensaio para acertar aquela ligação feita sem discar o número. Como nas aulas que tive, os detalhes eram comidos, e eu precisava acertar. Ensaiei o suficiente. Não escolhi o personagem. E agora sigo no improviso.
Se fosse para ser alegre o tempo inteiro fugiria com o circo e passaria a noite vestida de palhaço. Seria uma mulher inteira pintada de piadas. Não sou. Leveza e alegria são outro departamento e ele só abre em ocasiões especiais. Não sou alegre o tempo inteiro e nem vou me forçar a ser para agradar meia dúzia de pessoas que se escondem atrás do anonimato.
Isto me atinge. Confesso. Mas me atinge do jeito inverso ao esperado. Tenho dó de quem não tem coragem de ser o que é. Porque se dói, eu berro aos quatro ventos. Se é bom, eu sorrio. Se é de verdade, deixo meu sorrisinho leve sair. Deito molinha, com o céu rodando e as estrelas brilhando, e a bebida misturada ao meu sangue. Aponto as estrelas e tento achar a estrela que vive meu sonho. O meu sonho está lá brilhando. Ando atrás dele. Às vezes, a luz quase me cega. E é nestes momentos de cegueira que me pego ligando para certas coisas ridículas. Estou cega porque há muita verdade. Muita coisa boa acontecendo. Muitas pessoas que fazem a diferença brotando.
Aqueles personagens, o último gole da coca aguada. O meu eu que tem medo de aceitar as coisas e as pessoas. O outro que quer viver a sucessão do ontem sem se preocupar em mudar. A que se enche de coisas para não viver a vida. E a menina que chora ao perceber que ninguém entende nada. Um filme que prometia ser só mais um. Mas "não por acaso" me fez chorar as quase duas horas. Me via desfilar por ali e não conseguia me pegar. Não quero ser nenhum deles. Porque não vou ficar aqui tentando segurar a vida com as mãos. Elas vão correr por está cidade. Descer as escadarias do centro. Atravessar a praça Roosevelt correndo. Olhar a cidade do morro mais alto. E vou levar a minha mala sem pesar. Porque ela vai comigo agregando as coisas. E que sejam bem vindos todos os meus eus. Nem sempre alegre e nem tão pouco triste. Tenho a maior alegria que alguém que vive com a pressa de um amanhã, poderia ter. A certeza de que sou eu e o mundo de mãos dadas. E essa cidade respirando e transpirando pelos meus poros. Tenho certeza. Talvez a única. De que vou conseguir ser o que quero ser. Independente do que queira ser. Porque eu não paro no caminho para tacar pedras nos outros. Se não há o que ser dito, mantenho meu silêncio. E as pedras no caminho eu mesmo levo. Eu mesmo me taco pedras para tê-las que arrancar e chegar no final mais forte. O que eu preciso está em mim. E isto ninguém me tira. Obrigada por toda a atenção dispensada. E pelos comentários anônimos. Por mais pedras que me fortalecem no final. Realmente, obrigada.
E agora engulo meu último gole de coca aguada, amasso o pacote de pipoca, saio de cena com os olhos ainda vermelhos e uma leveza que não saberia explicar.