Destino
Era um daqueles dias em que o sol escondia-se atrás das montanhas e os passarinhos brincavam como crianças atrás da janela fechada para enganar o frio. Ela procurava, fazia e relia anotações no seu bloquinho. Enquanto ele procurava o primeiro cd que ela fez, aquele cd que ele guardou, riscado e ouvido a exaustão, com o segundo fez o mesmo. O terceiro não ouviu tanto, guardou como se fosse o primeiro, só queria ter a prova da existência daquelas coisas. Então, pegou eles todos, os enfileirou e perguntou a ela:
- Nas suas anotações quem sou eu?
Estranhou a pergunta, estranhou os cds ali enfileirados, na cabeça dela ele não deu importância nenhuma e ela já não ligava tanto. A importância tinha preenchido os vazios que ele não notava e isso era o suficiente. Tirar ele daquela vida monótona e o colocar entre essas montanhas, observando aqueles passarinhos, com a paz nos silêncios. Nunca perguntaram porquê das coisas. Não queriam respostas óbvias e muito menos falar que elas não existiam. Não havia cobrança e daí a estranheza. Ele nunca quis saber porque as histórias delas continuavam triste mesmo com toda a poesia. Nunca perguntou de onde vinha tanta piada nas histórias alegres. Ele não queria o porquê. E então ela disse:
- Você, você é o todo das minhas anotações. A melhor história criada pela vida. A sua ficção fez da minha realidade melhor. As palavras são injustas com você, porque são complexas demais para desenhar a sua simplicidade.
Ele a olhou sorrindo e ali, eles souberam, nada precisava ser dito. Bastava um olhar e a paz que eles sentiam em poder dividir o silêncio. O jeito que ele mexia nos cds e ela revirava anotações. Não precisava de nada, tudo o que aconteceu e o que aconteceria já havia sido ouvido e escrito no destino deles, e o melhor, isso, nem eles sabiam...
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Quebrando o silêncio ela deixou o bloquinho, ele colocou um dos cds e eles se beijaram como se não houvesse amanhã.