quinta-feira, abril 24, 2008

GOLD TICKET

Era ainda uma menina com quinze anos. Como seria quando chegasse aos dezoito e muito provavelmente quanto passasse dos trinta. Seria menina no corpo de mulher e com obrigações de adulto, ainda assim uma menina, com suas manias guardadas e o jeito que procurava alegria na vida.

Caminharia pelos sonhos, sorriria para o acaso, teria muitos relacionamentos vazios e outros cheios demais para ser verdade. Conheceria milhares de pessoas e se sentiria sozinha, o mundo é pequeno sem ter com quem dividir coisas banais, teria uma grande amiga. Seria salva pela vida milhares de vezes e morreria por ela. Trocaria a tristeza por palavras, as lágrimas por risadas, deixaria do lado de fora da vida tudo que julgasse insignificante demais. Os problemas grandes e sem solução, ela resolvia com o tempo deles. As brigas dos pais, as dúvidas quanto ao futuro, amores e desamores que o tempo sempre tratou de levar pela mão. Entregou a ela as lembranças de tudo que é bom. Deixou em suas mãos o que não poderia ficar longe. O tempo e o jeito que a menina sorria para embrulhos prateados.

Nunca teve tanta certeza quanto os outros acreditavam. Não entendia e não conseguia acreditar que alguns fossem simplesmente passar pela vida. Odiava o jeito que as pessoas carregavam vontades e deixavam em pensamentos ilusões maravilhosas.

Essa garota caiu algumas vezes, é verdade, depois olhou para trás e viu o quanto tinha aprendido e como tinha tirado proveito das dificuldades. Até da morte e do jeito que ela nunca soube lidar com perdas. Preferia não ter a perder. E certas coisas tem o tempo limitado demais. É certo demais. E o demais sempre deu a ela um desespero infantil, como se a tivessem entregue o gold ticket da fábrica de chocolates e ela pudesse comer tudo, sem passar mal como aquele garoto guloso.

O problema dela sempre foi o jeito que lidou com o demais. E como queria com força de criança as coisas. Choraria, algumas noites em silêncio, quando notasse que as vontades não passavam com o sono e a certeza de não ter. Choraria em tardes frias quando a falta apertasse e ela soubesse que tudo estava ao seu alcance e tão longe dele. Até que lembraria do seu amigo, ligaria para ele, e conversaria sobre a vida e a falta de cor. Perguntaria se estava sendo ridicula, mesmo que soubesse a resposta, e ele negava porque também sabia que ela só sabia ser daquele jeito.

Graças a um embrulho prateado, com o livro da adolescência/infância, dos dias idos ela percebeu: graças a vida e ao passado, ela não conseguiria conter a vida. Jogaria o jogo do contente, mesmo que fosse destrambelhada demais para ele, precisava de esforço e ela não sabia medir força nem espaço. Jogaria do jeito dela, com a tristeza aparecendo vez ou outra, mas sem se fechar dentro de buracos. Ela sempre foi boa equilibrista, se mantinha entre cordas bambas de sonhos coloridos, e se caisse tinha aquele braço que sempre a amparava. Sozinha, ela nunca esteve, mesmo que no mundo ela só soubesse ser assim.

E sabe por que eu não falo: 'pára de drama, falta pouco, é assim mesmo'. Porque eu já fiz drama e reconheço eles, não é, só o cansaço natural, o cansaço saudável de quem não parou na vida. Falta pouco, é verdade, sempre falta pouco até o próximo passo e a gente não consegue medir ele. E não é assim mesmo, porque sempre é possível melhorar ou piorar as coisas, é a nossa responsabilidade torta com a vida.

Eu acredito.
Eu ainda acredito.









ps: ah, um dos melhores presentes de aniversário atrasado, não dá pra falar o quanto eu gostei. Dois livros infantis gênios ganhos no meu aniversário de dezenove anos. Obrigada, obrigada, obrigada.