Post its
Se as palavras fossem menores e o sentido não perdesse se as cortasse, isso ficaria muito bom em post its espalhados pela casa, para nunca esquecer de ser, eu.
“Até mesmo seu coração era grande. Era coração, aquele escondido pedaço de ser onde fica guardado o que se sente e o que se pensa sobre as pessoas das quais se gosta? Devia ser. (…) E argumentava de si para si, lembrando músicas e poemas vagamente vulgares que falavam em coração: pois se alguém fazia uma música ou um poema forçosamente devia ser mais inteligente do que ela, que nunca fizera nada. Alguém mais inteligente certamente saberia o lugar exato onde ficam guardadas essas coisas.
Ai, a necessidade que tinha de doer em alguém, como se já estivesse exausta de tanto ser grande e boa. Por um instante conteve um movimento, toda concentrada no desejo de ser pequena e má e vil e mesquinha. (…) Ou continuar a ser grande, mas sem aquela bondade que pesava, para tornar-se lasciva. Obscena. (…) O importante era que o motivo não fosse importante. Justamente aí estava o obsceno.
A dor que sentia de ser assim tão como era.
O espelho refletia um rosto amassado de pessoa em estado de desordem interna e externa.“
Caio Fernando Abreu